PM que matou jovem negro em SP foi reprovado em teste psicológico da Polícia Científica do Paraná dois anos antes
09/07/2025
(Foto: Reprodução) Em 2023, Fabio Anderson foi reprovado em três critérios avaliados. Crime em SP foi no dia 4 deste mês. PM alegou que confundiu jovem com assaltante. PM diz que policial de folga cometeu 'erro de avaliação' ao atirar marceneiro
O policial militar Fabio Anderson Pereira de Almeida, suspeito de matar um marceneiro com um tiro na cabeça por engano em São Paulo, foi reprovado na fase de exames psicológicos de um concurso público da Polícia Científica do Paraná em 2023, dois anos antes do caso.
Guilherme Dias Santos Ferreira, de 26 anos, foi assassinado por Fabio Anderson na sexta-feira (4) enquanto corria para pegar o ônibus de volta para casa, 10 minutos após bater o ponto de saída no trabalho. No boletim de ocorrência, o PM alegou que confundiu Guilherme com um assaltante. Entenda abaixo.
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No Paraná, o policial concorreu a uma vaga ao cargo de Agente Auxiliar de Perícia Oficial, que ofertava vagas para Curitiba e outras cidades do Paraná. Ele disputou uma vaga na capital e litoral.
O g1 teve acesso ao processo de Fabio Anderson. Conforme o teste, ele não atingiu os parâmetros esperados em três das 10 características avaliadas.
À direita, o PM Fábio Almeida, que matou por engano Guilherme, de 26 anos
Reprodução/TV Globo
O processo não detalha as três categorias que o levaram à reprovação, porém, o documento mostra que ele apresentou classificação baixa nos critérios Agressividade Controlada e Equilíbrio Emocional; e muito baixa na classificação Trabalho em Equipe.
Pelas regras do concurso, ele foi considerado inapto e não avançou no processo. Ao divulgar o resultado para o candidato, a banca avaliadora destacou que "os resultados obtidos não pressupõem a existência de transtornos mentais" e indicavam somente "que o avaliado não atendeu aos parâmetros exigidos para o exercício das funções do cargo".
O então candidato entrou com recurso administrativo e, sem resolução, recorreu da decisão judicialmente e pediu para voltar à disputa pela vaga alegando "vícios insanáveis", como "indícios de subjetividade e irregularidade, o que gerou prejuízo ao candidato".
No processo, a Procuradoria-geral do Estado do Paraná afirmou a avaliação seguiu os critérios do edital e as normas do Conselho Federal de Psicologia e argumentou que não existia subjetividade ou contradição na Avaliação Psicológica porque ela "foi realizada de forma bastante criteriosa, tendo sido efetuados diversos testes regidos por normas técnicas, com observância de critérios e resoluções do Conselho Federal de Psicologia, inclusive a Resolução que regulamenta a avaliação psicológica em Concursos Públicos".
O caso foi avaliado pelo juiz Diego Santos Teixeira, do Juizado Especial da Fazenda Pública, que negou os pedidos feitos por Almeida e destacou que "não cabe ao Poder Judiciário discussão acerca do mérito da decisão proferida pela banca examinadora".
O processo continua em tramitação judicial no Paraná.
A Polícia Científica do Paraná não quis se manifestar sobre o caso. A defesa do policial também optou por não se manifestar e afirmou que aguarda o andamento das investigações.
A Secretaria de Segurança Pública de São Paulo disse, em nota, que o "ingresso de agentes na Polícia Militar segue critérios rigorosos de seleção, incluindo o exame psicológico, avaliado por uma banca de especialistas da área que seguem as normas do Código de Ética do Psicólogo".
"Os resultados dos testes, que são validados pelo Conselho Federal de Psicologia, levam em conta os dados disponíveis no momento da análise. Cabe reforçar que não há impedimento legal para uma pessoa prestar um novo concurso para a polícia mesmo após ter sido reprovado anteriormente em qualquer tipo de exame anterior", afirmou a pasta.
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Vítima voltava do trabalho quando foi assassinada
No boletim de ocorrência, o PM, que estava de folga, afirmou que pilotava uma moto pela Estrada Ecoturística de Parelheiros quando foi abordado por suspeitos armados que tentaram roubar sua moto. Ele reagiu com disparos e, durante a confusão, Guilherme foi baleado e morreu no local.
O agente, do 12° Batalhão de Polícia Militar Metropolitano, chegou a ser preso em flagrante por homicídio culposo após o crime, na noite de 4 de julho, mas pagou fiança e foi liberado. Ele foi afastado do serviço operacional.
Na mochila, Guilherme carregava um livro, marmita, talheres e a roupa de trabalho. A viúva dele afirma que ele foi assassinado a "sangue-frio" e pelas costas por ser negro.
Mais sobre o caso: 'Só porque é um jovem negro e corria para pegar o ônibus', diz viúva
Há quase três anos, Guilherme era funcionário de uma fábrica de camas e baús. Ele estava no segundo dia de trabalho após retornar das férias. Segundo a família, ele fazia diariamente o trajeto em que foi assassinado.
Pouco antes do crime, ele avisou a esposa que já estava indo embora.
"Deu 22h e eu dormi, e do nada acordei às 2h. Olhei meu WhatsApp e tinha mensagem dele: 'Estou indo embora' às 22h38. Era duas e meia da manhã e ele não tinha chegado. Ele nunca foi de chegar tarde em casa, sempre chegou no horário. Se ocorresse alguma coisa, ele me avisava", disse.
Testemunhas e colegas de trabalho afirmam que a vítima saiu do trabalho às 22h28 — cerca de sete minutos antes do crime, ocorrido às 22h35. Um funcionário da empresa onde ele trabalhava apresentou imagens com registro do ponto eletrônico que confirmam o horário de saída.
Status publicado por Guilherme Souza Dias em seu WhatsApp minutos antes de ser morto por PM
Arquivo pessoal
'Erro de avaliação'
O coronel Emerson Massera, chefe de comunicação da Polícia Militar do Estado de São Paulo, afirmou à TV Globo que o agente cometeu um "erro de avaliação".
"O policial, naquela tensão da ocorrência, comete um erro de avaliação. Um erro de avaliação que, infeliz e lamentavelmente, custou a vida de um rapaz", disse Massera.
"Vamos analisar todas as circunstâncias dessa ocorrência com o objetivo de fazer justiça, mas também temos que considerar que o policial inicia essa ocorrência como vítima."
Segundo o protocolo da PM, o policial pode reagir para se defender e proteger terceiros em um assalto, mas deve agir com cautela para evitar danos colaterais e mortes injustificadas. A investigação quer entender por que o agente entendeu que Guilherme poderia atentar contra a vida dele.
Guilherme Souza Dias, que foi morto por PM após sair do trabalho na Zona Sul de SP
Reprodução/redes sociais
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