Ex-funcionários da Unimep relatam espera de anos para receber direitos trabalhistas
06/05/2025
(Foto: Reprodução) Situação ocorre em meio a crise financeira da rede metodista, que levou ao leilão de bens como parte do campus Taquaral, em Piracicaba, na segunda-feira (5), por R$ 20 milhões. Rede de supermercados compra parte do campus da Unimep em Piracicaba por R$ 20 milhões
Ex-funcionários da Universidade Metodista de Piracicaba (Unimep) aguardam há anos o pagamento de direitos trabalhistas. A situação ocorre em meio a uma crise financeira da Rede Metodista de Educação, que levou ao leilão de bens como parte do campus Taquaral, em Piracicaba (SP), comprado por R$ 20 milhões por uma rede de supermercados nesta segunda-feira (5).
A decisão pela venda do campus, que ocorre para pagamento de dívidas, foi tomada pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS), no processo de recuperação judicial da rede metodista.
O grupo mantenedor da Unimep pediu mediação judicial para acerto de débitos, após fechamento de 30 cursos em Piracicaba e Santa Bárbara d'Oeste, com reflexo para cerca de 500 estudantes, devido a dificuldades financeiras.
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Entre os trabalhadores que ainda esperam receber está a analista de recrutamento Michele Melo, que enfrenta a situação há seis anos. Ela trabalhou na área de Recursos Humanos na Unimep por 12 anos.
"Depois de um tempo, houve uma sequência de atrasos de salário, questões relacionadas a plano médico, e aí foi virando uma bola de neve. Em 2019, eu cheguei no meu limite emocional e financeiro, porque a gente trabalhava e não tinha esse retorno. E eu pedi o desligamento, fiz o meu pedido de rescisão indireta e estou com processo ainda com a Unimep. Mas antes disso foi um período extremamente rico. Eu tive a oportunidade de crescer na Unimep", relata Michele.
A ex-funcionária revela que ainda tem cerca de 70% do valor devido a receber.
"É um valor devido, é um valor legal, não é um valor que foi pedido além do que eles contrataram. Então, eu espero com certeza [receber]. E, do fundo do meu coração, sempre foi um desejo que a universidade retomasse as atividades", completa.
Área que abrigava o campus da Unimep vai a leilão
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Professor relata acordo descumprido
O professor Lorival Fante Júnior, que já ocupou cargos na diretoria da universidade, está em situação parecida.
Ele tentou realizar um acordo com a Unimep em 2018 para receber seus direitos trabalhistas, mas diz que as parcelas não foram pagas e teve de acionar a Justiça. Além disso, também é credor em processos coletivos contra a instituição.
"Apesar de estar na RJ [recuperação judicial], estou trabalhando, eu sou professor de outra instituição, mas a gente tem relatos de professores e funcionários em situações extremas de dificuldade financeira, com doença, e sem nenhuma motivação ou intenção de resgate da igreja ou própria mantenedora [da universidade] para resolver a situação", afirma.
Ele afirma que o problema atinge profissionais que se dedicaram à construção da instituição. "Com certeza, a gente pode dizer que quem construiu realmente foram professores, professoras, funcionários, a partir das suas políticas institucionais. E aí [ocorreu] o crescimento de toda a instituição em prédios, em imóveis que nós estamos vendo hoje sendo leiloados".
Lorival afirma que o plano de recuperação judicial referente ao pagamento dos ex-funcionários não vem sendo cumprido.
"De acordo com o plano, eles tinham uma previsão de pagamento de R$ 10 mil, se não me engano, até o final de 2023, e o ano passado eles tinham que cumprir até um determinado dado o pagamento do FGTS. Eles demoraram para pagar esses R$ 10 mil, pagaram parcelado, não pagaram integralmente a correção como se devia. E nós temos relato que uns não receberam nada do FGTS, alguns receberam parte do FGTS, mas não foi cumprido essa etapa. Fora isso, tem todos os outros valores ainda que eles têm que pagar", acrescenta.
Mapa mostra, em branco, a área do campus que será leiloada
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'Cada vez que passava na frente eu chorava'
Presidente do Sindicato dos Professores de Campinas e Região (Sinpro), Conceição Fornasari soma 43 anos como professora da Unimep. E também tem FGTS, salários e férias a receber. Ela trabalhou nos campus da Unimep em Piracicaba e Santa Bárbara d'Oeste e considera "muito triste" a situação atual da instituição.
"Cada vez que eu passava na frente do campus [de Santa Bárbara] eu chorava. Demorou muitos meses para eu parar de ter esse sentimento. Agora o [campus] Taquaral, gente, é o símbolo maior. Foi lá que eu comecei a dar aula. E quando a gente iniciou, no início dos anos de 1980, tinha um bloco, e quando essa tragédia da RJ [recuperação judicial] iniciou-se em abril de 2021, era uma imensidão. Nós tínhamos a ala da educação física, nós tínhamos a ala da psicologia, nós chegamos a ter 15 mil alunos", relembra.
Ela considera o cenário atual como o "fim de um projeto".
"[Fim] de um projeto político-pedagógico, de um projeto institucional e até o projeto de vida, porque nós abandonamos outras instituições para nos dedicarmos de corpo, alma e ciência à universidade. Então, realmente, ver esse símbolo material ser vendido, ser destruído, se transformar num mercado, é muito difícil, mas é mais difícil ainda saber tudo que nós construímos, a duras penas, ter sido levado ao vento", lamenta.
Ela também afirma que tem ocorrido descumprimentos do plano de recuperação judicial. "Nós [sindicatos] aprovamos o plano após muitas discussões. Então, era um plano que nós realmente entendíamos possível naquele momento e que iria dar conta de pagar os credores e de soerguimento das instituições", afirma.
E acrescenta que falta diálogo. "Faz um ano que a metodista se nega a sentar para conversar conosco e nem o juiz, nem o administrador judicial fazem qualquer movimento nessa direção. [...] A igreja poderia, com o leilão de ontem, já antecipar o pagamento dos credores. Ela optou para pagar a questão financeira".
Segundo o edital de leilão do campus Taquaral, a prioridade é destinar os R$ 20 milhões recebidos pela venda para pagar dívidas com um banco.
Piscina em área da Unimep que vai a leilão
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O que diz o Grupo Metodista
Em defesa do processo de recuperação judicial, o Grupo Metodista afirmou em nota, que está seguro de que essa medida é o caminho para reestruturar as instituições de ensino do grupo, "que exerce atividade econômica organizada há 140 anos no Brasil, promovendo forte impacto socioeconômico por meio da educação".
"É importante destacar ainda que a recuperação judicial assegura proteção judicial aos credores e garante a continuidade das atividades educacionais, preservando, assim, a comunidade acadêmica, atualmente composta por 20.000 alunos e cerca de 3.000 funcionários", acrescentou.
Imagem de arquivo do campus Taquaral, em Piracicaba
Fernanda Zanetti
O que diz a Delta Max
Em nota, a rede Delta Supermercados confirmou a compra de parte do imóvel onde ficava o campus Taquaral, em Piracicaba, e destacou que "essa aquisição foi realizada com profundo respeito pela história do espaço e por todos que fizeram parte da trajetória da Unimep".
O projeto prevê a construção de uma nova unidade do Delta Supermercados, de grande porte, segundo a rede. Além disso, a empresa estuda a instalação do seu Centro Logístico e Administrativo na área.
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