Justiça nega nova investigação sobre queda de helicóptero com 2 mortes mesmo após laudo apontar que piloto usou cocaína
15/10/2025
(Foto: Reprodução) Piloto de Ribeirão Preto (SP), João Augusto Tremeschin, morre após queda de helicóptero em São Paulo
Reprodução/Redes sociais
A Justiça negou o desarquivamento do inquérito policial sobre as circunstâncias que levaram à queda de um helicóptero em São Paulo que matou o piloto Edison dos Santos Mendes Alves, de 46 anos, e o copiloto João Augusto Tremeschin, de 37 anos, em 2022.
O pedido tinha sido feito por familiares do copiloto, que era de Ribeirão Preto (SP). Na petição, eles citaram um laudo que apontou que Mendes Alves tinha ingerido cocaína antes da viagem, além de ter um histórico de depressão. Também argumentaram que a empresa responsável pela contratação do comandante, a Majam Participações, não submeteu o piloto a exames antes da viagem.
Na mesma decisão, do início de outubro, a juíza Mariana Moraes Labre também negou o pedido da família para que todas as informações do processo, incluindo pareceres do Ministério Público, fossem enviadas à Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) e ao Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa) para uma eventual mudança visando mais segurança nas operações da aviação privada.
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Segundo apuração do g1, a decisão somente poderia ser revertida diante de um fato novo com relação ao caso. Mãe de Tremeschin, Tânia Veiga Hjertquist lamentou a decisão.
"É revoltante que um piloto sabidamente doente tenha assumido o comando de um helicóptero sob efeito de drogas e ninguém tenha o interesse de apurar como isso foi possível. É fisicamente, mentalmente desgastante ter que lidar com esse silêncio das autoridades. É como se duas pessoas não tivessem morrido e que a segurança de todos não fosse importante", disse.
O desastre e as investigações
O desastre aéreo foi em 5 de agosto de 2022. O helicóptero havia decolado de São Paulo com destino a Extrema (MG) para buscar Guilherme Benchimol, fundador e presidente executivo do Conselho de Administração da XP Investimentos.
Antes de chegar ao destino, a aeronave atingiu um morro e caiu sobre a floresta do Parque Taipas no bairro Jaraguá, ainda em São Paulo, por volta das 21h. Morreram o piloto Edison dos Santos Mendes Alves e o copiloto João Augusto Hjertquist Tremeschin, únicos ocupantes do helicóptero.
Segundo o inquérito policial, Alves estava no comando e era colaborador da empresa responsável pela operação do helicóptero, a Majam Participações. Já Tremeschin era funcionário da JTBFly, empresa que tinha sido contratada para buscar o empresário, a quem a Majam havia cedido o uso da aeronave.
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A investigação policial foi arquivada mesmo com a constatação de que Alves, segundo o laudo toxicológico, havia consumido cocaína e medicamentos ansiolíticos antes do voo.
A investigação também não levou em consideração, segundo a família de Tremeschin, que Alves havia recentemente enfrentado um quadro de depressão e não foi submetido pela empresa a nenhum exame médico para apontar se estava apto ou não.
Piloto de Ribeirão Preto, SP, morre durante queda de helicóptero em São Paulo
A própria Majam, responsável pelo piloto, argumentou durante as investigações que, pelo fato de ser de uso privado, a aeronave estava sujeita apenas ao regulamento RBAC 91, mas não ao “Programa de Prevenção do Risco Associado ao Uso Indevido de Psicoativas na Aviação Civil”, ou seja, não havia obrigação de se fazer nenhum exame no comandante.
Depois de três anos, o Cenipa apontou em um relatório final uma série de problemas que podem ter contribuído para o acidente, inclusive o exame que confirmou a presença de cocaína no organismo de Alves, mas não fez recomendações específicas à Anac, que poderia se embasar nesse tipo de apuração para adotar mudanças.
Na ocasião, o Cenipa informou que as conclusões e recomendações do relatório final foram elaboradas com base em critérios técnicos e na análise minuciosa de dados, de acordo com protocolos alinhados com a aviação civil internacional e de acordo com documentos como o Código Brasileiro de Aeronáutica (CBA).
A Majam Participações, por sua vez, havia informado que tudo tinha sido esclarecido e que não havia fatos novos.
A Anac confirmou que, nas regras atuais, não há exigência de exame toxicológico para obtenção do certificado médico aeronáutico (CMA), mas que mudanças estão sendo discutidas.
Quando procurada pelo g1, a família do piloto Edison dos Santos Mendes Alves não quis falar sobre as circunstâncias do acidente.
Por que o desarquivamento foi negado?
A decisão da Justiça que negou novas investigações se baseou em um parecer do Ministério Público, reforçado pela Procuradoria-Geral de Justiça, que não identificou elementos suficientes para motivar uma nova investigação.
O pedido de desarquivamento havia sido solicitado pela família depois que Majam, ao responder a um processo trabalhista, confirmou não ter realizado nenhum exame clínico no piloto depois que ele alegou ter se recuperado de um quadro de depressão.
O promotor Marcelo Otávio Médici, ao analisar a petição dos familiares, argumentou que não havia fato novo nessa informação.
"Ocorre que essa informação da 'depressão' do piloto Edison já estava nos autos, por manifestação da empresa Majam", disse.
Queda de helicóptero aconteceu na região do pico do Jaraguá, Zona Norte de São Paulo, perto de uma torre de alta tensão no dia 5 de agosto de 2022
Reprodução/Cenipa
Além disso, ele reiterou a tese, já apresentada antes, de que não seria possível responsabilizar criminalmente nenhuma pessoa da Majam, já que atribuir culpa sem uma autoria específica foge à área criminal. Muito menos caberia, segundo o promotor, a responsabilização do piloto, que morreu.
O promotor também mencionou que a Majam não estava obrigada a realizar os exames porque suas operações estavam sujeitas a uma norma, o RBAC 91 - que não previa esse tipo de procedimento.
"Desse modo, não tendo o dever legal de exigir o exame ao piloto Edison, a 'omissão' de algum representante da empresa Majam, alegada pelos peticionantes, perde a relevância penal."
O representante do MP também reforçou a informação anterior de que o Cenipa, mesmo após emitir um relatório final, não apura incidentes aéreos com o intuito de responsabilização criminal, mas sim para prevenção e melhoria das operações.
"O próprio Cenipa já havia explicado claramente que 'as investigações realizadas pelo Cenipa não buscam o estabelecimento de responsabilidades, tampouco se dispõem a comprovar qualquer causa provável de um acidente, mas elaboram hipóteses que permitem entender as circunstâncias que podem ter culminado na ocorrência.'"
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